No meu canto não escondo
Vou dizendo de vereda,
Sou brasa de labareda
E ferrão de marimbondo,
Desde que o mundo é redondo
Não tem esquina nem canto!
Amigos eu lês garanto
Quando este mundo acabar,
Com certeza vai ficar
A verdade do meu canto!
Meu canto guarda o estilo
Das fontes de geografia
Quando o gaúcho nascia
Abarbarado e tranquilo;
Meu canto é o canto do grilo,
Dos tempos de antigamente
Que pode ser estridente,
Mas jamais ultrapassado,
Por que o canto do passado
É o bebedor do presente!
Meu canto lembra o relincho
E sanga de pedregulho;
Meu canto lembra o mergulho
Da manada de capincho!
Meu canto evoca o bochincho
Quando o candeeiro se apaga,
Ali onde ninguém indaga,
Nem quem foi e nem quem é,
Se é crioulo de Bagé,
Santana ou São Luiz Gonzaga!
Canto que evoca o rodeio
E a ronda de uma tropeada
E a velha gaita acordada
Resmungando num floreio;
Canto que lembra o rio cheio
E a clarinada de um galo;
Canto que adoça o embalo
De uma xirua que implora
Que a gente não vá simbora
E desencilhe o cavalo
Canto de lida e serviço
Cheirando a chão de mangueira,
Sovado uma vida inteira
Decerto mesmo por isso,
Conserva aquele feitiço
Que nós todo conhecemos,
Heranças que recebemos
E não se compra ou se vende,
Por isso o povo me entende,
E todos nos entendemos!
Há os que condenam meu canto
De cousas que já passaram,
Dizem q muitos cantaram
E chega de cantar tanto,
Contra isso eu me levanto
Sem procurar desafetos,
Não se apagam com decretos
Heranças de todos nós
Não vou matar meus avós
Pra ficar de bom com os netos,
Não vou matar meus avós
Pra ficar de bom com os netos!