Quando saiu de casa, do colégio e da TV
Sem papai nem mamãe no pé
É hora de me libertar
Disse João Horácio aos 17
Desde pequeno já sabia que era diferente
Sorriso bonito e cara de inocente
E um jeito confiante no olhar
João era o dito garoto exemplar
Passou logo no primeiro vestibular
Mas estava cansado de sempre ter que acertar
Morando agora na capital
Longe de tudo
Conhecendo de perto a solidão
Tendo de se virar pela primeira vez
Percebeu que 2 e 2 também podem ser 3
E decidiu aprender o que a escola não pode ensinar
Muita farra, bebida, fez vários amigos
Com grana no bolso e mulherada atrás
Tornou-se então o mais popular
Todos já sabiam em qualquer espaço
Quem é que mandava agora no pedaço
Era João Horácio
Mas tanto sucesso despertou inveja
Em toda a playboyzada da zona sul
Que armaram pro João e então ele se ferrou
-Chegou a tua hora, qual é meu irmão?
-Agora vamo vê quem é o bom?
Nascia a vingança de um quase inocente
Pouca gente sabia, mas João também era conhecido no outro canto da cidade
Onde chegou a notícia e com indignação todos juraram vingança sem piedade
E inexplicavelmente, improvavelmente começaram a acontecer acidentes
Toda a playboyzada aparecia arrebentada sem motivos, razões ou
precedentes
Três dias depois na capa dos jornais
A foto de João nas manchetes principais
Acusado de espancar jovens da "socialite”
Foi pra delegacia onde tomou outra surra
Dessa vez pelo menos com um pouco de culpa
E o ódio em seu sangue a pulsar
Liberado então na manhã seguinte
João já era homem, tinha mais de 20
E estava de novo na casa de seus pais
Armaram pra mim, eu não tive culpa
Mas não abaixo a cabeça pra filho da puta
Que se esconde debaixo da saia do papai
Nem vou ficar esperando sentado
Que a justiça decida cuidar do meu caso
Chegou a hora de me manifestar
A essa altura João já era irreconhecível
Qualquer coisa era motivo pra barbarizar
Passava noites em claro procurando respostas sem encontrar
E a história foi parar na televisão
Afinal ele era culpado ou não?
Com tantas perguntas não tinha tempo pra pensar
Decidiu então partir pra guerra de palavras
Onde era bem mais forte do que a playboyzada
E em rede nacional disparou seu desabafo
Sociedade hipócrita e manipulável
Que cede ao dinheiro e fica acomodada
Sem lutar contra o que é errado ou imoral
Saibam que um dia tudo acaba
Quem é senhor hoje amanhã pode ir pra senzala
Quem vence hoje um dia já perdeu
Deus não se compra, muito menos se vende
Cultura não se ganha, e sim se aprende
Respeito é pra quem merece e não pra quem quer
Mais vale ser honesto e decente
Do que viver da corrupção canibal
Felicidade não se encontra em anúncio de jornal
Espero um dia ver um mundo cheio de gente esperta
Preparada pra fazer sempre a coisa certa
Meu nome é João Horácio e não agüento desaforo não
Desde então ninguém mais soube do paradeiro de João
Não se sabe se partiu, ou se alguém o calou por dizer verdades demais
Pra uns era um maluco, pra outros era genial
Mas todos concordam que o que João falou ainda cala muito doutor